Vamos lá que este ainda não é o destino final! (mas só de saber que ia estar umas horas em Pequim fiquei com muita vontade de "espreitar"...vai para a lista!)
Fui-me deixando para o fim da fila no embarque apenas para observar quem passava. Lá estava o suspeito companheiro de viagem, agora na companhia de um outro! Já são dois, pensei! Até doze ainda faltam 9 (eu também conto!). Estava enganada...
E por me ter deixado para o fim da fila não tinha onde colocar a mochila da cabine! O avião era grande, as pessoas muitas e já estava muita coisa guardada e eu não ia chegar à bagaceira superior! Uma suposta simpática assistente de bordo prontificou-se a fazer de conta que me iria ajudar! Com um sorriso rasgado sugeriu-me que optasse por deixar a mochila mais para a frente em relação ao local onde me iria sentar - sempre era em caminho para quando fosse hora de sair do avião, umas 10h depois daquele momento! Lá fui enquanto olhava para as bagageiras superiores à procura de lugar para a mochila e a pensar comigo própria: "como é que eu vou lá chegar?" Lá surgiu um espaço para colocar a mochila e nesse momento percebi que as assistentes de bordo fazem questão de demonstrar que não estão ali para nos ajudar a colocar mochilas nas bagageiras. Uma outra assistente apontou o lugar e nada mais! E lá me estiquei. Bicos de pés, estica barriga, levanta braços com uma mochila que deveria estar a pesar uns 4 kg (mais coisa, menos coisa), equilibra, desequilibra, tende para trás, abdominal puxa-me para a frente e lá sinto um empurrão vindo não sei bem de onde, que enfia a mochila no seu lugar! Figurinha...
Volto para o meu lugar e fico mesmo sentada entre o suspeito nº 1 e o suspeito nº 2. Coincidências ou talvez não! Trava-se aí a primeira troca de palavras:
- Vais para Phnom Penh, certo? - perguntou o suspeito nº 1, que passaria nesse momento a ser o primeiro companheiro da viagem.
- Sim, respondi. Faço parte do grupo da passagem de ano da Nomad. Claro que já não me lembro se foram exatamente estas as palavras que trocamos, mas foram nesta linha de pensamento.
- Olha esse é o Shane! Fica à vontade com ele. O rapaz é simpático. Travou conversa comigo aqui em Amesterdão. Vai para Pequim.
Ah, ok! Afinal, o 2º suspeito era um companheiro de etapa e não um companheiro de viagem.
- Hello Shane! My name is Tânia.
- Hi Tânia. Pleased to meet you. I'm Shane, from Norwich.
E dei por mim a pensar na criação de canários do meu pai. Não disse nada sobre os canários, porque naquela primeira troca de palavras percebi que Shane teria assunto para toda a viagem! Seriam 9h30 de voo.
E Shane teve mesmo reportório para todo o caminho (no ar não se deve usar a expressão "caminho"). Contou-me como conheceu a sua namorada chinesa, que teria ido estudar para Norwich. Tinha origem numa província da China perto da fronteira com a Coreia do Norte e pertencia a uma família muito tradicional. Como tal, a família não aceitava este namoro. O seu pai dizia mesmo que nem que o Shane aprendesse a falar chinês (e o pai dizia isto por saber da baixa probabilidade de tal acontecer) consentiria o namoro entre os dois. Como o pai da namorada do Shane (não soube o nome dela) pertencia à polícia, a namorada teve que marcar estadia em hotéis fictícios para que ninguém desconfiasse dos encontros entre os dois. Seriam três semanas de férias clandestinas, à revelia da família. Seria uma história de amor, se o próprio Shane não a desacreditasse logo à partida. Não acreditava naquela relação e, segundo ele, o mais provável seria terminar a relação no fim da viagem. Perdi interesse na estória naquele momento.
Mas Shane era figura! Por vezes certificou-se se eu estaria mesmo a dormir...deixaria de estar nesses momentos! Encomendou o menu do comandante. Não sabia que o comandante tinha um menu especial e muito menos que poderia ser encomendado online por 20 euros. Não aprecio este tipo de diferenças entre pessoas. Espreitei curiosa para perceber o que o compunha: sushi e sashimi de entradas, uma carne estufada de prato principal, fruta e doce de sobremesa e um espumante! Eu fiquei bem com o meu jantar, mas não me recordo o que era. O cérebro estava em modo de repouso e só gravou o seria diferente do habitual, ainda que tivesse comido uma refeição chinesa.
Chegados a Pequim, como acontece quando um voo chega a algum lugar, e se calhar um bocadinho mais em voos tão loooonnnggooooooossss estávamos todos ansiosos por sair daquele avião, de esticar as pernas, de tratar da burocracia para a próxima etapa. Mas as portas não abriam. Esperava sem pensar em nada em particular, quando um polícia chinês vem em "contra-maré" avião adentro. Falava falava e só alguns o estariam a entender. O cansaço lentificava-me o raciocínio e prolongava até o tempo de reação à admiração daquele momento. O polícia apontava, falava chinês e queria que alguém lhe desse algo, assim imaginei pelos gestos que fazia. Um sr, que esteve a viagem toda sentado ao lado do meu companheiro de viagem, entregou-lhe o passaporte. O polícia leu o passaporte e gesticulou (falou também mas de nada me valia prestar atenção às palavras) indicando que esse sr o acompanhasse. Não tendo capacidade de perceber o que quer que fosse do que diziam, devo ter acordado nesse momento de tensão dentro do avião e deixei-me atenta à linguagem corporal de ambos. O polícia mostrava bem a autoridade. Era um polícia alto para a média do observado nos chineses, de ombros largos, com voz alta e firme. O sr que o teria de acompanhar ficou nesse momento mais pequeno do que a média dos chineses, baixou a cabeça e senti que desejou que ninguém lhe visse a cara, que estava tão vermelha, que se lhe percebia o calor e o acelerar do coração. O que teria feito? O que lhe ira acontecer?!
Saímos depois nós, rumo à burocracia, mais umas horas de espera até à próxima etapa.
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